Na Audiência Geral desta quarta-feira, 16, o Papa Francisco retomou sua reflexão sobre discernimento e meditou sobre a desolação que, segundo o Pontífice, “pode ser ocasião de crescimento”.
O Santo Padre sublinhou a importância de “ler o que se move dentro de nós, para não tomar decisões apressadas, na onda da emoção do momento, para depois se arrepender, quando já é demasiado tarde. Neste sentido, o estado espiritual a que chamamos desolação, quando no coração tudo está escuro, triste, pode ser ocasião de crescimento”.
Ainda de acordo com o Pontífice, a “desolação provoca uma trepidação da alma”, “ela nos mantém alertas, favorecendo a vigilância e a humildade, protegendo-nos contra os ventos do capricho. São condições indispensáveis para o progresso na vida e, portanto, inclusive na vida espiritual. Uma serenidade perfeita, mas ‘asséptica’, sem sentimento, quando se torna o critério de escolhas e comportamentos, torna-nos desumanos”, afirmou Papa Francisco, acrescentando que precisamos estar atentos aos nossos sentimentos, prestar atenção ao que sentimos.
“Não podemos deixar de prestar atenção aos sentimentos, somos humanos e o sentimento é uma parte da nossa humanidade, e sem entender os sentimentos seremos desumanos, sem viver os sentimentos, seremos indiferentes ao sofrimento dos outros e incapazes de aceitar o nosso. Sem considerar que esta ‘serenidade perfeita’ não se alcança por este caminho da indiferença. Distância asséptica: eu não me misturo nas coisas, tomo distância. Isso não é vida, isso é como se vivêssemos num laboratório, fechados para não pegar um micróbio, uma doença. Para muitos santos e santas, a inquietação foi um ímpeto decisivo para dar uma reviravolta na própria vida. Esta serenidade artificial não é boa, mas sim uma inquietação saudável. Um coração inquieto, que busca o caminho”, disse.
Para ilustrar sua reflexão sobre a atenção que devemos ter em relação aos sentimentos, o Santo Padre cita o exemplo de Agostinho de Hipona, Edith Stein, José Benedito Cottolengo e Charles de Foucauld: “as escolhas importantes têm um preço que a vida apresenta, um preço acessível a todos. As escolhas importantes não vêm da loteria, elas têm um preço e você tem de pagar aquele preço. É um preço que você paga com o coração, um preço da decisão, um preço de levar adiante, com um pouco de esforço, mas não é grátis. É um preço que está ao alcance de todos. Todos temos que pagar esta decisão para sair do estado de indiferença que nos põe pra baixo”, sublinhou o Pontífice.
Convite à gratuidade
Para o Santo Padre, a desolação é também um convite à gratuidade, “a não agir sempre e unicamente em vista de uma gratificação emocional. Estarmos desolados oferece-nos a possibilidade de crescer, de começar uma relação mais madura, mais bela, com o Senhor e com os entes queridos, uma relação que não se reduza a uma mera troca de dar e receber. Pensemos na nossa infância. Quando se é criança, procura-se com frequência os pais para obter algo deles, um brinquedo, dinheiro para comprar um sorvete, uma autorização. E assim os procuramos não por eles mesmos, mas por um interesse. No entanto, o maior dom são eles, os pais, e compreendemos isso na medida em que crescemos”, disse.
Segundo o Pontífice, até as nossas orações em determinadas vezes são pedidos de favores para o Senhor, sem o interesse verdadeiro por Ele. “O Evangelho observa que Jesus vivia frequentemente circundado por muitas pessoas que o procuravam para obter algo, curas, ajudas materiais, mas não simplesmente para estar com Ele. Era pressionado pelas multidões e, contudo, estava sozinho. Alguns santos, e até certos artistas, meditaram sobre esta condição de Jesus. Poderia parecer estranho, irreal, perguntar ao Senhor: ‘Como estás?’. No entanto, é um modo muito bonito de entrar numa relação verdadeira, sincera, com a sua humanidade, com o seu sofrimento, até com a sua singular solidão. Com Ele, que quis partilhar até ao fundo a sua vida conosco”, sublinhou.
Aprender a estar com o Senhor
De acordo com o Papa, não devemos ter medo da desolação e sim “buscar encontrar o coração de Cristo, pois a resposta às nossas orações chegam sempre”. O Pontífice também destaca que nos faz bem “aprender a estar com o Senhor”, pois aprender a estar com Ele é semelhante ao que acontece com as pessoas de quem gostamos: “desejamos conhecê-las cada vez mais, porque é bom estar com elas”.
O Santo Padre ainda disse que “a vida espiritual não é uma técnica à nossa disposição, não é um programa de bem-estar interior que nos compete planificar. Não! A vida espiritual é a relação com o Vivente, com Deus, o Vivente, irredutível às nossas categorias”. “Quem reza observa que os resultados são imprevisíveis”, ressaltou o Pontífice.
Para finalizar sua meditação, o Papa Francisco disse que nunca devemos desanimar diante das dificuldades, “mas enfrentar a provação com decisão, com a ajuda da graça de Deus que nunca nos falta. E se ouvirmos dentro de nós uma voz insistente, que nos quer distrair da oração, aprendamos a desmascará-la como a voz do tentador; e não nos deixemos impressionar: façamos simplesmente o contrário do que ela nos diz”, concluiu.