Romaria é experiência humana e espiritual com o poder de ajustar interioridades, possibilitando, a cada romeiro, alcançar o sentido de sua vida, compreender melhor a sua própria jornada e, assim, ultrapassar limites existenciais. O ser humano, em romaria, tem a oportunidade de perceber que a realidade vai além de si, admitindo, pela profissão de fé, ser pequenino diante daquele que pode tudo: Deus. Essa experiência humana e espiritual cura, assim, o ser humano do orgulho e da soberba, tornando-o mais reverente Àquele que ultrapassa os limites dos projetos pessoais e dos entendimentos que afrontam os bens da Criação. Reconhecendo-se pequenino, o ser humano abre-se ao resgate que vem do Divino, à iluminação da “mina escura e funda da própria vida”, como reza a canção. Essa iluminação depende de olhar translucidado que permite reconhecer: só há um Senhor e todos os seres humanos são irmãos e irmãs. Uma irmandade que inclui as outras criaturas, compondo tudo como um louvor a Deus. Esse olhar inspira a busca por um novo estilo de vida, alicerçado no respeito aos irmãos e irmãs, capaz de bem expressar a adequada compreensão sobre o lugar de cada criatura e do Criador.
Fonte de nobreza, as romarias educam o ser humano para agir de modo coerente com a fé cristã, enfrentando preconceitos e manipulações - expressões da ausência de nobreza, pois nobres são aqueles que verdadeiramente amam, por um testemunho de respeito ao semelhante e ao conjunto da Criação na casa comum. Sem esses sentimentos cultivados na experiência de participar de romarias abrem-se feridas que perpetuam uma sociedade injusta, nada solidária e marcada pelos atrasos. Muitas romarias possibilitam a contemplação do meio ambiente, que inspira o louvor a Deus, Senhor dos bens da Criação. Participar dessas peregrinações é exercício que auxilia na recuperação de uma sensibilidade perdida, essencial à superação de crises climáticas e encaminhamentos inadequados, distanciados da justiça e da equidade. As romarias contemplam, pois, os pedidos pessoais, também tocam a consciência para inspirar o respeito a um planeta maltratado pelo descaso, por interesses individualistas, predatórios, que levam ao usufruto egoísta dos bens da Criação, pautando a vida segundo dinâmicas perdulárias do consumo e do descarte.
Nas romarias, o ser humano é confrontado por uma verdade existencial: todos, na Terra, são peregrinos de uma vida que passa, cada um dentro de seu próprio tempo. Vive-se, pois, uma contagem regressiva. A Romaria pela Ecologia Integral inspira atitudes satisfatórias para desacelerar a veloz contagem regressiva para um colapso do meio ambiente, com impactos sociais e humanos. Esses impactos, bastante degradantes, já são percebidos mundo afora, com deslocamentos forçados pela fome, miséria, com as guerras que se espalham por diferentes regiões. Tendem a se agravar com o avanço das mudanças climáticas que prejudicará, cada vez mais, a vida de muitas famílias. Um planeta adoecido significa também efeitos devastadores para a humanidade, com impactos na saúde, na geração de empregos, no acesso a muitos recursos essenciais à vida. O descompasso ambiental destrói o tecido social, alimentando uma política que aquartela grupos de interesseiros cartoriais e oligárquicos em detrimento de uma cultura da vida e do encontro. Compreende-se porque a sociedade não se desenvolve na proporção de seu potencial – está contaminada por práticas que não permitem avanços participativos.
A crise climática é agravada por legislações permissivas, interesses meramente financeiros, ferindo a dignidade humana. Cuidar do meio ambiente não é simplesmente preservar fauna e flora. O cuidado com o semelhante é indissociável dessa tarefa, exigindo o cultivo de sentimentos e de atitudes que estão na contramão da matança de inocentes e de indefesos pela fome e pela violência. Cada gesto que expressa zelo, a exemplo do plantio de uma árvore, da preservação de um jardim, do combate ao desperdício, é um bem dedicado ao semelhante e ao planeta. Torna-se urgente, pois, cultivar sentimentos que alicercem atitudes novas, condutas mais adequadas, capazes de enfrentar as alterações climáticas. Todos se coloquem a caminho, em romaria, como peregrinos, para encontrar um novo modo de se viver e de conviver na casa comum. Eis uma singular oportunidade: a 6ª Romaria Arquidiocesana pela Ecologia Integral que será celebrada neste fim de semana, no Centro de Belo Horizonte.
Em romaria, à luz da fé, o coração humano sensibiliza-se e reconhece as causas humanas para as crises enfrentadas pelo planeta. Ao mesmo tempo, os peregrinos unem a própria voz aos que buscam sensibilizar potências e grupos econômicos fortes, preocupados prioritariamente em obter lucros maiores, em curto espaço de tempo, desconsiderando limites na exploração do planeta. Colocar-se na condição de peregrino - de passagem pela Terra - é necessária qualificação para reagir, com condutas transformadoras desde a intimidade do lar até a elaboração de megaprojetos, superando abordagens predatórias da natureza. É preciso deixar-se sensibilizar humanamente pela obra do Criador, reconhecendo a generosidade que vem da natureza, da Criação, com suas dádivas aos seres humanos. Participe da 6ª Romaria Arquidiocesana pela Ecologia Integral, em Belo Horizonte, amanhã, a partir das 7h30, na Praça da Estação, em uma caminhada até a Igreja da Boa Viagem, com a disposição de peregrino e aprendiz, para ser agraciado com o nobre sentimento de cuidar do meio ambiente, em respeito ao Criador. Assim, convencer-se da prioridade de cuidar uns dos outros, em solidariedade fraterna, atitude essencial para construir novo tempo, com uma sociedade mais justa.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte